Com um grande acompanhamento e homenagens de familiares, parentes, amigos, músicos e admiradores, o corpo do cantor e compositor maranhense Raimundo Makarra (Raimundo João Pinheiro Júnior) foi sepultado às 15 h de ontem, no Cemitério do Gavião. Vítima de AVC (Acidente Vascular Cerebral), ele foi internado, em estado grave, no dia 13 de julho, no Hospital Djalma Marques (Socorrão I), na Rua do Passeio, quando ficou à espera de um leito de UTI, o que aconteceu poucos dias antes do seu falecimento, aos 65 anos, ocorrido na manhã de quarta-feira (14), e após repercussão de vídeo nas redes sociais. Foi servidor da TV Educativa (TVE), atualmente Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), como programador visual. Nascido em 12.10.1953, em São Luís, Makarra, morou grande parte da vida no Codozinho (Centro), e, nos últimos tempos, no Bairro Bequimão, onde tinha muitos amigos, conforme era o seu feitio. Ele era divorciado e deixou dois filhos. O corpo de Makarra foi velado na Central de Velório da PAX, no Centro.
COM PERSONAGENS DO BUMBA-BOI, UMA POSE PARA O COMERCIAL DOS SUPERMERCADOS MATEUS
O conjunto da obra de Makarra foi sintetizado por Cesar Teixeira, seu contemporâneo e amigo de longas datas. Entrevistado ao telefone, na tarde de ontem, o ás de Oração Latina foi ao tempo em que eles eram estudantes do Liceu Maranhense (diurno), e o então Macarrão, em vista da magreza, explicita, se envolvia na onda do rock, em que tocou contrabaixo em alguns conjuntos. Graduou-se em Desenho Industrial, pela UFMA, e trabalhou na antiga TVE, da Fundação Roquete Pinto, aonde, aliás, CT nunca passou da frente, por que antes de entrar era convidado pelo imortal jornalista e cronista Ubiratan Teixeira, decano da empresa, a frequentar um bar de esquina onde cerveja era consumida por um papo de gente grande, horas esquecidas.
MAKARRA EM CD COM TITULO DE MÚSICA DO SEU AMIGO CESAR TEIXEIRA
No 1.º Festival de Mùsica da UFMA — O 1.º Festival Universitário de Música Popular (Fump) ocorreu no segundo semestre de 1979, em meio às manifestações em defesa da meia-passagem no transporte coletivo de São Luís. Eu me achava em O Imparcial, fazendo o estágio curricular do Curso de Comunicação Social (Jornalismo e Publicidade) da UFMA, e de noite, na calçada da inesquecível Bibica, no Largo da Av. Rui Barbosa, eu peruava Cesar Teixeira e José Pereira Godão, alinhavando Sentinela com que eles concorreriam no certame. CT não poderia assinar a obra por não ser ainda universitário que seria de Jornalismo, e no dia da disputa resolveu ficar no Bar de Wiliam Freio, na Madre de Deus, aguardando o resultado.
Novilho Mágico, Sentinela e Negritude — Estava no ar, no auditório do Campus (Jarbas Passarinho), que, só para provocar a censura da ditadura militar, as composições que embalaram o I Fump carregaram no teor da mensagem política: raízes africanas, desigualdades sociais, opressão: eram os temas preferenciais das músicas inscritas. No palco, do campus, Godão, Rogério do Maranhão, JM Cunha Santos, Norberto Noleto (com a canção Papagaio), Raimundo Makarra (com a toada Novilho Mágico) e Zezé Alves. O júri oficial deu o primeiro lugar para Sentinela, interpretada por Gabriel Melônio (com Eliane no vocal); e o público elegeu como melhor música Negritude, de Cunha Santos, interpretada por ele e a irmã Val Moreno. E Makarra deu conta do recado, com Novilho Mágico: “Vai dizer ao povo/que a porteira rompeu!”
CESAR TEIXEIRA, QUE ENTENDE DO RISCADO, COMO POUCOS, DEU DEZ PARA MAKARRA E BOI DE LÁGRIMAS
O parto de Boi de Lágrimas — Certamente, foi numa das barracas de palha, no Largo da Festa de São Pedro, na Madre de Deus, que Makarra deu à luz Boi de Lágrimas, quando as montanhas estiveram em dores de parto, mas delas não nasceria nunca um ridículo rato! O cantor e compositor Cesar Teixeira, que não é de jogar confete em carnaval errado, reconheceu, em sua entrevista a este repórter, ainda ao telefone: “É uma das mais bonitas canções do repertório maranhense, em qualquer tempo”! E deu umas cotoveladas nos contrários, para referir-se à genuína música maranhense, que é a folclórica: “É o que recebemos dos nossos mestres, como Zé Garapé, Luís Costa, João Chiador, dentre outros!”
Gravado por Alcione no CD Uma Nova Paixão — Boi de Lágrimas recebeu gravação de Papete, Boi Barrica, e, em 2005, pela cantora conterrânea Alcione, no CD Uma Nova Paixão, o 27.º álbum de estúdio dela, , quando Makarra ganhou sua notável repercussão.
A última conversa: Essa música vai esbarrar na posteridade!— Falei com ele há dois anos, em um bar do Conjunto Bequimão, onde tomava um refrigerante, após eu deixar de táxi a professora Graça Rodrigues, no apartamento do casal amigo (Raimundo Pereira Souza e Edna), cunhado e irmã da distinta, natural de Codó(MA), recém-chegada de Brasília (DF), onde está radicada por três décadas, e aqui fizemos um “tur”, na área do Reviver (Praia Grande). Foi eu despachar o carro de aluguel, e ele me olhar, veio logo o tratamento que me dispensava e a pergunta inevitável: “Meu poeta maior, tens visto Cesar?” Ali, ele falou da possibilidade de shows, que aconteceriam em número abaixo da perspectiva, entre 2018/9. E a pergunta que não queria calar: O teor de Boi de Lágrimas foi mesmo acontecido contigo? E Makarra, duro na queda, e inteligente gozador, não lhe deixou por menos: “Dos pés à cabeça, meu poeta!” Agora, dois anos após do que seria nosso derradeiro bate–papo, eu, cá, com meus botões: “Essa música vai esbarrar na eternidade!”
COM ZÉ LOPES, NUM SHOW DE CARNAVAL, NA MESMA JARDINEIRA
Deu no Blog do Zé Lopes — “E falando em Raimundo Makarra, o nosso grande compositor, depois de gravar um comercial para uma rede de supermercados, passou por um problema de saúde e se encontra em recuperação em um hospital de nossa capital. Breve estará em casa, com a força de Deus e dos santos juninos!”
Não deu, como todos nós sabemos, infelizmente! Agora, é mexermos os pauzinhos, para acontecer a regravação de Novilho Mágico, Boi de Lágrimas, e outras maravilhas dele, para ele não morrer tão cedo!
“Boi de Lágrimas” – Raimundo Makarra
Sabiá Já mostrou seu canto
Enfrentou cantor do Boi da Pindoba
Ê boi…
Chegou prenda do Rosário
Beirada nunca viu tanto brilho e clarim
Chiador,
levantou Maioba
Chão tremeu, quem fez ?
Foi Maracanã.
Ê boi, chegou
Batalhão da Mata,
Enfrenta o contrário no cordão
Ê boi…
Zé França Pereira viu
Esse boi tão pequeno chegar
Madre Deus de São Pedro fez
Esse boi chorar…
Levanta boi e vai
Que é pro amo ver
Que boi também chora,
Também sente dor
Que boi também chora,
Também sente dor
Que boi também chora
Lê lê lê lê lê lê lê.
Texto: Herbert de Jesus Santos
Fotos: Divulgação